Procura-se o corvo fofoqueiro
O gabinete do prefeito de Belo Horizonte, Fuad Noman (PSD), tem estado desde o final de semana passado empenhado numa missão informal: descobrir quem foi o fofoqueiro que andou espalhando que o mandatário, reeleito para mais quatro anos de governo, não sobreviveria até 19 de dezembro, data da diplomação para o novo mandato. Com fortes dores na perna e pés muito inchados, Fuad despachou a semana passada de casa, onde recebeu secretários, assessores e políticos. No sábado, ele foi internado e três dias depois recebeu o diagnóstico de neuropatia periférica, efeito colateral do tratamento de câncer. Recebeu alta na quinta-feira (28).
Aparência de “doente”
Quem esteve com o prefeito esses dias realmente se assustou com a aparência de Fuad. De cadeira de rodas (por causa da dor nas pernas), barba por fazer e afônico, ele “parecia estar doente mesmo”, nas palavras de um assessor próximo. Mas a saúde do prefeito estaria sob controle. Fuad sofre as consequências do tratamento contra o câncer, que se encerrou durante as eleições, mas ainda causa efeitos no corpo. O boletim médico assinado pelo Dr. Enaldo Melo de Lima atesta que o linfoma não Hodkgin teve remissão completa.
“Os últimos dias foram de cuidar da saúde, de problemas causados por efeitos colaterais de meu tratamento bem sucedido contra o câncer”, disse o prefeito.
Telefone sem fio
O problema, que causou revolta nos aliados de Fuad, é que uma das pessoas que visitou o prefeito na semana passada saiu da casa dele estimando apenas mais 15 dias de vida para o político. Mesmo sem ser médico, o interlocutor deu o diagnóstico funesto para jornalistas de seu convívio e a notícia ganhou rapidamente as redações de Belo Horizonte. A grande suspeita é que o fofoqueiro seja um atual integrante do primeiro escalão do governo estadual.
De: Padre autor da ‘oração do golpe’
Para: Juíza antifeminista de Divinópolis
Uma juíza mineira foi citada na trama golpista detalhada nesta semana pela Polícia Federal. A diretora do Foro da Comarca de Divinópolis, Andrea Barcelos Ferreira Camargo Faria, aparece no relatório final da PF (leia a íntegra) por ter recebido um e-mail do padre José Eduardo de Oliveira e Silva.
O padre de Osasco (SP) é acusado pela PF de integrar o "núcleo jurídico" do esquema golpista, tendo colaborado na elaboração da minuta que visava impedir a posse do presidente Lula (PT). A PF aponta que ele participou de reuniões com figuras chave do movimento golpista, como o ex-assessor Filipe Martins e o advogado Amauri Feres Saad.
O padre afirmou ter enviado à juíza documentos sobre: "Direito Natural". Sabe-se, contudo, que um dos textos é de autoria do advogado Saad, apontado no relatório da PF como um dos mentores intelectuais da minuta golpista.
‘Essa mulher’
No Youtube é possível assistir vários vídeos de palestras da juíza de Divinópolis em igrejas católicas ministrando teorias conservadoras. A juíza faz diversas menções a Judith Butler (filósofa e autora de obras que revolucionaram os estudos de gênero), em tom crítico. "Foi essa mulher (Butler) que movimentou as ONGs feministas e as feministas comunistas e introduziu o conceito de gênero na ONU", disse a juíza.
Cultura da morte
Nas palestras, a juíza critica a fluidez de gênero proposta por Butler, argumentando que apaga a identidade do ser humano e o transforma em uma "metamorfose ambulante". Também associa a ideologia de gênero a uma "cultura da morte" que inclui o aborto, a eutanásia e a pedofilia. Ela também critica o feminismo, argumentando que é manipulado por grupos de esquerda com o objetivo de destruir a família tradicional.
Ditadura divina
Já o padre criou também uma "oração do golpe" pedindo a Deus que os militares tivessem coragem de "salvar o Brasil". A PF encontrou evidências de que essa oração foi enviada para diversos contatos, com a intenção de mobilizar apoio para o golpe. O padre teria, inclusive, pedido que a mensagem fosse repassada apenas para pessoas de “estrita confiança".
No relatório, o padre negou qualquer participação na elaboração da minuta golpista, alegando que suas visitas a Brasília se deviam a "atendimento espiritual". No entanto, a PF considerou as evidências robustas o suficiente para justificar sua prisão preventiva e a proibição de contato com outros investigados.
A juíza, por enquanto, não é investigada.
Espíritos da floresta
Se há uma vantagem em ser repórter — diante de tantas desvantagens - é sem dúvida conversar com pessoas tão extraordinárias como o xamã do povo Yanomami Davi Kopenawa. Na quinta-feira (28), foi publicada uma entrevista que fiz com ele na Repórter Brasil.
Somente neste ano, Kopenawa foi recebido pelo papa Francisco no Vaticano, foi destaque da Salgueiro na Sapucaí e aplaudido efusivamente durante o Festival de Cinema de Cannes. Contudo, em Roraima, sua terra natal, precisa circular dentro de viatura escoltado por policiais armados. Por defender os direitos do seu povo, não pode andar livremente.
Também fiz, recentemente, a última entrevista da guerreira Tuíre Kayapó e ouvi o cacique Raoni, meses antes dele subir a rampa ao lado do presidente Lula. Aliás, foi nessa entrevista que ele anunciou o apoio ao petista.
Som nada orgânico
A seleção musical do Sacolão ABC, na avenida dos Andradas, na região Leste de BH é supimpa. Uma curtição fazer a feira, ver todas aqueles legumes e frutas coloridos — com cartazes feitos com esmero e manualidade anunciando as ofertas da semana — ouvindo Raul Seixas, Wando e Sá, Rodrix & Guarabira. Contudo, o sacolão da mesma rede na Avenida Antônio Carlos, a caminho da Pampulha, não oferta trilha sonora semelhante. Escutei apenas louvores enquanto apalpava melões e pepinos.
Todas as vias
As avenidas Antônio Carlos e Andradas homenageiam a mesma família, cujo político mais jovem casou na semana passada: o deputado estadual Doorgal Andrada (PRD). Parlamentares da base governista e da oposição viajaram para Trancoso, na Bahia, convidados para a festa e aproveitaram o feriado da Consciência Negra para estender a viagem.
Prioridades
A caravana nupcial esvaziou a Assembleia, incluindo a Comissão de Participação Popular, que debate os projetos de privatização da Cemig e da Copasa apresentados pelo governo de Romeu Zema (Novo). ”A grande maioria está hoje em um casamento, lá para as bandas da Bahia. Um casamento muito badalado", reclamou o deputado Leleco Pimentel (PT).
Tradicional família mineira
Não é fácil a vida do deputado que decide questionar o poderio da família Andrada, uma dinastia política cujo ancestral mais famoso foi José Bonifácio de Andrada e Silva, o Patriarca da Independência e tutor de Dom Pedro II.
Figurinhas repetidas
Com a eleição de Lafayette de Andrada (Republicanos) para deputado federal, em 2022, a família, com raízes em Barbacena, ocupa uma cadeira no Parlamento brasileiro antes mesmo da Independência, em 1822. Lafayette é o décimo sexto Andrada na Câmara, segundo reportagem de Édson Sardinha para o Congresso em Foco. O clã também fez quatro presidentes da Câmara, oito ministros de Estado e dois ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), além de governadores, prefeitos, deputados estaduais e vereadores.
Em festa de jacu, inhambu não pia
Esta Capivara que vos escreve não foi convidada para tirar o paletó nas praias do sul da Bahia, mas viu pelas redes sociais o presidente da Câmara Municipal de BH, Gabriel Azevedo (MDB), cantando música sertaneja usando um chapelão durante a festa. Dias antes, Azevedo estava curtindo Nova York.
O rio corre para o mar
Difícil encontrar um brasileiro em melhor fase do que o cineasta Walter Moreira Salles, um dos herdeiros do Banco Itaú e da mineradora CBMM, que explora nióbio em Araxá. Salles acumula fortuna de US$ 4,5 bilhões, sendo um dos três cineastas mais ricos do planeta. Seu filme Ainda estou aqui recebe todos os aplausos do momento e é cotado para o Oscar.
Vida de aplausos
Salles passou a infância em Paris, a adolescência na zona Sul do Rio de Janeiro (quando a textura do mundo era a de um filme Super-8), morou em Lisboa e estudou cinema na Califórnia. De tempos em tempos lança um filme aclamado pela crítica: Central do Brasil, Abril Despedaçado, Diários de Motocicleta, entre outros.
Glorioso
Para 2024 ser um dos melhores ano na vida dele só falta o Botafogo, do qual é fanático torcedor e credor (emprestou R$ 28 milhões para o clube), ser campeão da Libertadores e do Campeonato Brasileiro. O danado ainda é bonito. Na próxima “encadernação” quero nascer belo, herdeiro e talentoso. Até pedi o ChatGPT para me desenhar com o topete do Waltinho na imagem que abre o boletim.
O meu é maior do que o seu
Veículos de jornalismo de Belo Horizonte iniciaram uma disputa narrativa para definir quem é o líder de audiência no cenário digital. Itatiaia, Estado de Minas e O Tempo lançaram campanhas nos últimos dias dizendo que estão na frente. Mas, por trás dos dados há um objetivo simples: dizer para o mercado publicitário que é líder e, assim, conseguir cotas maiores de anúncios.
Investimento
Logo após as eleições, a Itatiaia, que, nos últimos três anos, investiu alguns milhões de reais no departamento digital lançou campanha para ressaltar que é a líder em audiência não só nas ondas de rádio, mas também no ambiente digital. A campanha usou números da plataforma SimilarWeb, que já havia colocado a empresa entre os sites com maiores crescimentos do ano, para se autodeclarar líder da corrida.
Resposta rápida
Num contragolpe, pela segunda vez no ano, o jornal O Tempo também lançou campanha para se autodeclarar o ponteiro da disputa. A publicidade divulgada pela empresa de Vittorio Medioli dá conta que o site tem quase o dobro de páginas visualizadas que o segundo colocado não citado nominalmente. Para a disputa, é considerada a plataforma Comscore e o intervalo de janeiro a outubro.
Contabilidade criativa
Na sequência, foi a vez de o Estado de Minas contra-atacar. Pioneiro no jornalismo em ambiente digital, o EM publicou que ele sim é o líder de audiência do segmento entre junho e outubro, segundo a mesma plataforma de medição. Neste caso, a Itatiaia nem mesmo foi citada. A diferença aqui é que o EM soma os acessos do portal UAI, com os do em.com.br e do site de esportes.
O Comscore é a plataforma usada pelo governo federal para direcionar a verba de publicidade. Uma das estratégias adotadas por alguns portais de notícias, como o Metrópoles, por exemplo, é firmar parcerias com sites menores e somar na conta de audiência do Comscore os dados dos parceiros, resultando em um número inflacionado.
Dilemas da educação
O pai limpa o bumbum do filho, de 2 anos, e escuta a pergunta:
- Quando eu crescer vou poder limpar sozinho?
-Vai sim!
-Vou poder limpar o bumbum do Pedro também?
- Melhor não.
Não deixe de ler (ou ouvir) também
Fabiana Moraes, em sua coluna na Gama, detona a comunicação do governo Lula, que parece não entender a ameaça golpista espalhada pelo Brasil.
Depois de ler A noite do meu bem (2015 - Cia das Letras), de Ruy Castro, contando a história dos sambas-canção fiz uma playlist indicada para quem deseja sofrer amargamente na mais funda fossa existencial: aqui, no Spotify.
::Expurgo 04::
Por que ler O voo da guará vermelha (2014 – Alfaguara – 160 páginas) de Maria Valéria Rezende?
Tanto para quem viu, quanto para quem nunca viu uma revoada de guarás vermelhos (para estes últimos, indico uma viagem ao delta do Parnaíba no Piauí!), o título do livro nos deixa curiosos.
Mesmo não sabendo ao certo a cidade onde se passa o encontro entre Irene e Rosálio, voltei a uma das obras que mais me tocou escrita por Maria Valéria Rezende.
Ela, uma prostituta soropositiva, com a doença em estágio já avançado. Ele, um ajudante de pedreiro analfabeto.
A delicadeza de Rosálio, seja no modo como chega e coloca sua presença e seu corpo diante de Irene, encanta o leitor desde a primeira página do livro. Curiosamente, a obra não possui diálogo. As falas dos personagens são marcadas unicamente pela diferença de formatação do texto. E os títulos de seus capítulos foram escolhidos pela autora como expressões que sempre possuem uma cor.
A narrativa nos coloca dentro desta união, que ao contrário do que se possa pensar, não surge ou se sustenta por uma relação sexual. Não existe machismo, piedade mútua, ou qualquer vulgaridade entre o casal.
Nos dias que convivem no local de trabalho de Irene, o que acontece são momentos em que a prostituta, doente e exausta dos programas que faz para sobreviver, descansa no peito daquele homem. Ele, extremamente sensível e sábio, talvez por todo o sofrimento pelo qual passou até chegar ali, conta a ela infinitas histórias.
É de Rosálio: "Pois a desgraça é assim: se a gente não sabe, nem fala que ela está ali presente, ela quase nem existe. E já depois que se disse ainda, é preciso tempo. Contar tudo muitas vezes, para poder pegar o jeito de se sentir infeliz.”
Abandonado pelo pai e órfão de mãe, o personagem sonha em levar ao mundo suas histórias. Apesar de analfabeto, ele é um brilhante contador, que não carrega algo que considera uma virtude humana: a alfabetização. Aqui merece registro a cena em que a autora descreve a morte da mãe de Rosálio, por mais triste que seja, nos remete à delicadeza da prosa de Maria Valéria, afastando qualquer angústia na leitura.
O encanto deste encontro está justamente na diferença, mesmo que exista em comum o estado de extrema pobreza.
Rosálio é carente da técnica das palavras, mas afortunado pelas experiências de vida. Já Irene é aberta em todos os poros e tecidos, por saber e imaginar cada canto em que ele passou, cada pessoa com quem conviveu e cada paisagem que seus olhos viram.
Não me parece ter ocorrido entre eles paixão ou amor romântico de nenhuma das formas que conhecemos. E não cairia no clichê de pensar em um encontro de almas, porque é muito pouco para o que Maria Valéria consegue escrever em um livro tão curto.
Claro que existe o tocar dos corpos, a comunhão das bocas e o esfregar da pele de ambos. "O sabor que pode ter tocar-se o corpo de um homem por nada, só por carinho”, descreve a autora, uma freira, cônega de Santo Agostinho.
Nada se compara a oitiva sedenta de Irene e ao modo como Rosálio escolhe ainda sem símbolo cada uma de suas palavras, cada construção de metáfora e cada diálogo por ele narrado.
Um dos pontos que mais nos prende na leitura é quando Rosálio conta a Irene sua experiência vivendo em um garimpo. Os riscos de morte, os jogos de poder, a violência e as dificuldades para sobreviver em meio a um ou outro achado de ouro.
O que Irene e Rosálio vivem, com certeza, vai além da carestia aparente. Talvez seja, sim, algo semelhante a amar.
Maria Valéria consegue, com a beleza e riqueza de sua escrita, afastar qualquer ideal romântico imaginado por nós neste encontro. Imagino que isso se deve à experiência de vida da autora de 81 anos, que militou nos anos 1960 na Juventude Estudantil Católica (JEC) e, depois, nas fileiras da Teologia da Libertação.
O livro pode ser lido como um acaso ou um simples encontro. Pode ainda revelar as letras, os sonhos, a pobreza e o Brasil. Mas acima de tudo ele trata de um contar histórias. Este contar que nos coloca no mundo. Neste mundo. No mundo dos outros e em alguns que nem sequer sabemos existir.
Se a leitura provoca no ser humano a empatia para nos tornarmos melhores, continuar a ler nos redime do julgamento - próprio e dos outros.
Tenho observado que vários estabelecimentos comerciais estão abandonando a sofrência, a exemplo do sacolão Abastecer da Av. dos Andradas, no bairro Pompeia, onde compro e, às vezes, dá vontade até de sair dançando diante da qualidade das músicas. Quem ainda não arredou pé da sofrência sertaneja é a loja do Assaí do bairro Santa Efigênia. É duro fazer compras ali. A loja devia pagar adicional de insalubridade à sua clientela.